Uma discussão frequente no estudo da história da arte, especialmente dos movimentos que compreendem as chamadas arte moderna e arte contemporânea, é a separação entre forma e conteúdo, uma cisão de caráter semiótico definido em estruturas de símbolo e significado. Pois me pareceu ao visitar a exposição de Pablo Lobato que o artista deseja explorar esse intervalo semântico que habita as instâncias do visível. O artista, em algumas obras, propõe um diálogo entre imagem e representação, diálogo este presente no estudo da arte desde o Platonismo.
As obras de Lobato, no entanto, assemelham-se mais às obras de arte conceitual do que necessariamente à discussão clássica de mimesis. Há um diálogo, uma relação, entre a imagem, o que ela “representa” e o real, ou para me valer dos termos da história da arte, entre o visível, o legível e figurável. As obras da série “Muda” , que consistem em fotografias de frutas sem suas sementes expostas em molduras de madeira onde se encontram depositadas sementes das frutas representadas, lembram-me de uma série feita pelo artista René Magritte chamada "A traição da imagem" ("La trahison des images") especialmente o quadro onde o artista pinta uma maçã e escreve abaixo dela "isto não é uma maçã" (ceci n’est pas un pomme).
Ambos os trabalhos apelam para a mesma questão que atormentava Platão, a divisão entre o real e o representável. Se, no entanto, para o platonismo essa mimesis era o decaimento de uma ideia, para Magritte e para Lobato essa cisão habitual no campo da linguagem é parte das modalidades do visível. Tal como Kosuch nos coloca em frente às três cadeiras, Pablo Lobato nos coloca em frente dessas frutas que existem a um só tempo enquanto imagem na fotografia e enquanto potência na semente.
As obras de Lobato parecem colocar até mesmo o espaço nesse lugar do entre, suas intervenções no ambiente expositivo vão desde um recorte na parede até uma instalação audiovisual que é ativada aleatoriamente e preenche o lugar com uma badalada de sinos. Tudo para deslocar aquele que observa do lugar habitual de contemplação; apesar de que, nesta exposição, ainda somos convidados apenas a contemplar, todavia a questão se complexifica à medida que as próprias obras da exposição nos perguntam para que estamos olhando.
De fato, a maioria das obras de expostas tem quase (ou nenhum) interesse contemplativo que dure mais de três minutos no máximo, no entanto o que fica delas é o incômodo que provocam ao mostrarem que não podem ser plenamente vistas. E é este, creio eu, o princípio desta exposição: mostrar que na realidade a natureza das coisas, principalmente dos objetos de arte, é nunca permitirem serem completamente observados. Essa ideia culmina na exposição de um vídeo que o artista criou dentro de determinado software que faz com que o vídeo só possa ser visto um número finito de vezes, deteriorando-se a cada vez que é exibido. É um vídeo mortal, tal qual aquilo que representa. Esta é a natureza das coisas.