O Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) apresenta a exposição "Intervenções entre XIX e XXI" que reúne vinte artistas, entre alunos e professoras da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA) e da Universidade Federal Fluminense (UFF). A exposição tem o objetivo de promover diálogos com as obras do acervo a partir de releituras contemporâneas.
Uma das intervenções é da professora e artista Beatriz Pimenta, um vídeo objeto intitulado de “Descanso dxs modelos (homenagem a Marcia X)”. Um quadro com uma bela moldura exposto na altura da canela do espectador, onde é reproduzido (a partir da técnica do Chroma key) um vídeo com uma “reencenação” do quadro Descanso do modelo, de José Ferraz de Almeida Júnior.
No quadro de Almeida Júnior de 1882, a cena retratada é de um pintor em seu ateliê, sem pincel na mão, olhando para o modelo que está em frente a um piano com as costas nuas e com a cabeça voltada também em direção ao pintor. Como o título demonstra, é um momento de descanso do modelo e do pintor, que, aliás, parecem conversar.
Em seu vídeo, Beatriz Pimenta trata de gênero, o ordinário e a profanação. O gênero pode ser construído e desconstruído, pode ser entendido como algo mutável e não limitado, sendo assim ela brinca com questões que permeiam a obra original: “O” modelo do título estaria se referindo ao gênero do personagem? Seria uma mulher ou um homem? Modelo tem gênero? Trazendo para um contexto atual, seus modelos não tem gênero, como deixa claro no título (dxs). Formas femininas e masculinas se misturam sempre de costas para o observador que, a essa altura, já não se importa mais com seu gênero.
O ordinário tanto pode ser o comum (habitual), como o obsceno. Nessa conjuntura a artista retrata tanto um como o outro. Seus personagens se mostram descontraídos, conversando, rindo, mexendo em livros e notebooks ao mesmo tempo em que fazem gestos de sexo oral, se beijam e encenam uma cena sádica (prazer com a dor alheia). De uma maneira tão natural e engraçada essas cenas acabam não chocando o espectador; talvez até tire dele alguma risada.
“Descanso dxs modelos (homenagem a Marcia X)” é um trabalho provocador, irônico e irreverente. Em certo momento do vídeo fica evidente a homenagem a Marcia X, seja pela utilização do livro que aborda sua vida e obra ou seja pelo X que aparece no meio da tela. Todavia, mais do que elementos formais óbvios, o trabalho de Beatriz demonstra uma essência similar ao de Marcia X: a profanação. Seja “violando” a sacralidade de uma pintura clássica e inserindo nela gestos pornográficos ou expondo seu trabalho na parte de baixo da parede, fazendo com que o observador olhe para o chão e não para o alto, tirando qualquer santidade desse gesto simples e, ao final do vídeo, ela ainda profana seu próprio meio tecnológico de fazer arte, deixando transparecer seu Chroma key e o negativo de seus modelxs.
Referências bibliográficas:
Disponível em http://br.sputniknews.com/cultura/20160714/5634081/museu-belas-artes-missao-artistica-francesa-brasil-ufrj-uff.html [Consultado em 30/07/2016]
Alice Guimarães Bandeira. (2013). Descanso do modelo e outros primorzinhos: crítica de arte e pintura de gênero brasileiras no final do século 19. Disponível em http://www.ppgav.eba.ufrj.br/wp-content/uploads/2015/03/artigos-alice.pdf [Consultado em 15/08/2016]
Beatriz Pimenta Veloso. (2016). descanso dxs modelos. Disponível em https://vimeo.com/180777783 [Consultado em 20/08/2016]
Disponível em http://marciax.art.br/mxTexts.asp?sMenu=3&sTipo=4 [Consultado em 20/08/2016]